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A Beleza como elemento intrínseco da Obra

PROF. FRANCISCO CALDEIRA CABRAL
Extracto de Conferência realizada na Sala dos Actos do I. S. de Agronomia, em 18 de Maio de 1956, em Fundamentos da Arquitectura Paisagista, pp 40.

Convém agora examinar, com mais vagar, o aspecto estético da questão, porque é muito frequente encontrarmos aqui pontos de vista perfeitamente errados. Os mesmos erros se manifestam em relação à arquitectura quando, por exemplo, alguém procura um arquitecto para lhe desenhar uma fachada para uma planta já estudada, com o fundamento de que é preciso embeleza-la.

Também connosco se dá o mesmo: trazem-nos um mono e nós que tratemos agora de o embelezar e lhe dar pitoresco! Nestas duas palavras, embelezar e dar pitoresco, se encerra afinal claramente todo o equívoco, que em suma se traduz: julgam que a beleza de uma obra de arte é um atributo extrínseco da obra, uma espécie de roupagem que se veste a uma boneca de trapos e faz dela uma grande senhora! Embelezar é o grande erro. Trata-se de criar obra intrinsecamente bela e, portanto, hão de ser as suas próprias características que lhe hão de conferir o atributo de beleza. E nunca, como neste nosso caso, se pode aplicar com mais fundamento a definição agostiniana de beleza: “Pulchritodo est splendor ordinis.” É que de facto, a beleza de uma paisagem há-de ser justamente o esplendor dessa ordem, que se manifesta no equilíbrio biológico dos diversos factores que nela actua e na sua perfeita adequação aos interesses dos homens que nela vivem. Trabalhando, como atrás dissemos, com matéria viva, nós temos de nos sujeitar às suas leis próprias e servimo-nos da própria interacção desses factores para conseguir os efeitos que desejarmos. Assim todo o trabalho de concepção tem de contar desde o inicio com o jogo destes múltiplos factores e não pode ser uma mera concepção formal, arbitrária e estática, a impor a todos os elementos.